SÃO PAULO – A poluição das águas alcançou o lugar mais remoto do planeta. Cientistas da Universidade de Newcastle e Aberdeen, no Reino Unido, detectaram “níveis extraordinários” de poluição provocados pela atividade humana nas fossas Kermadec e Mariana – o local mais profundo dos oceanos. A mais de 10 km de profundidade, pequenos crustáceos apresentam contaminação por produtos tóxicos 50 vezes maior que caranguejos que sobrevivem em rios fortemente poluídos.
A equipe analisou amostragens de anfípodes, pequenos crustáceos popularmente chamados de “pulgas do mar”, e encontrou dois tipos de substâncias tóxicas acumuladas em seus organismos: bifenilos policlorados (PCBs) e éteres difenílicos polibromados (PBDEs).
Um dado curioso é que esses químicos foram usados por quase quatro décadas até serem banidos no final dos anos 1970. Estima-se que 1,3 milhão de toneladas foram produzidas durante o período que os químicos estavam liberados, sendo que cerca de 35% delas acabam em sedimentos costeiros e em mar aberto.A descoberta dos materiais a altas profundidades do oceano comprova o grau de persistência desses poluentes, encontrados em organismos marinhos anos depois de serem banidos.
“Comumente pensamos nas profundezas dos oceanos como um reino remoto e imaculado, livre de qualquer impacto humano. Porém, nossa pesquisa mostra, infelizmente, que isso está longe de ser uma verdade. Os crustáceos que vivem naquela localidade continham níveis de contaminação semelhante ao encontrado na Baía de Suruga, uma das zonas industriais mais poluídas do Noroeste Pacífico”, disse Alan Jamieson, líder do estudo publicado na Nature Ecology and Evolution.
Todo o rio deságua no mar
Oceanos compõem o maior bioma do planeta, operando como um coletor em potencial para poluentes e lixo que são descartados nos rios. Os poluentes acabam sendo acumulados ao longo da cadeia alimentar e, quando chegaram às profundezas do oceano, as concentrações ficam muitas vezes maior que a encontrada nas águas de superfície.
“A pesquisa mostra que apesar de remoto e profundo, as profundezas do oceano estão altamente ligadas às águas da superfície. Nós somos muito bons em adotar uma abordagem de ‘fora da vista, fora da mente’, quando se trata de oceano profundo, mas não podemos mais ser complacentes”, diz Jamieson.
Ainda não se sabe exatamente como a contaminação chegou ao fundo do oceano. Alan suspeita que ilhas de plástico, formadas pelo lixo jogado nos mares, possam ter soltado os poluentes mar a fora. Com isso, os níveis extremos encontrados nas fossas oceânicas poderiam ser explicados a partir da nova dinâmica da cadeia alimentar: criaturas do alto mar consomem tanto os detritos plásticos quanto as carcaças contaminadas de animais mortos que afundam.
Outra dúvida do biólogo é a respeito do impacto dessa poluição no meio ambiente e nos humanos. “Ainda não há nenhuma conclusão a respeito disso, mas com os contaminantes sendo tão prejudiciais à vida, ninguém deve esperar boas notícias”.