SÃO PAULO – A cidade de Bangalore não é chamada de “Vale do Silício da Índia” à toa. É lá que fica o distrito de Whitefield, onde estão instaladas as sedes de gigantes do mundo da tecnologia como Dell, IBM, Oracle e Huawei, além de potências locais do setor, como a Infosys e a Wipro. Ficam em Bangalore, ainda, os centros de pesquisa e desenvolvimento de grupos como Airbus, Google, Mercedes-Benz e Shell, e os laboratórios responsáveis pelo programa espacial indiano. A cidade é a quarta região metropolitana mais produtiva do país, está entre as 300 mais ricas do mundo, e cresce a taxas que superam os 10% anuais. Bangalore, porém, pode se tornar inabitável a partir de 2020. E o problema da cidade tem um nome: água.
Historicamente, Bangalore sofre para garantir o acesso de seus habitantes ao recurso. Desde o século 16, por exemplo, autoridades têm construído lagos artificiais na região para acumular o líquido e abastecer os lençóis freáticos sempre que chove – coisa que não tem acontecido com grande frequência. Nos últimos 15 anos os problemas que sempre existiram, pioraram. Não só as chuvas passaram a cair com ainda menos frequência, mas a população cresceu em ritmo acelerado. Entre 2001 e 2017, por exemplo, o número de habitantes da cidade saltou de 5,7 milhões para 10,5 milhões.
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A infraestrutura de distribuição de água tratada da cidade, que nunca foi das melhores, não acompanhou o crescimento. Com a explosão de novas demandas – por moradia, escolas e transporte, entre outros – a água e as boas práticas de gestão de recursos hídricos foram praticamente esquecidas. Faixas longas e largas de terra foram impermeabilizadas para construir estradas e estacionamentos e antigos lagos artificiais foram aterrados para dar lugar a condomínios de prédios comerciais e residenciais. Um levantamento da revista Wired mostrou que, em 1986, eram 389 lagos, hoje, são 81, dos quais mais da metade está tão poluída que chega a se incendiar, tamanha a concentração de substâncias impróprias no líquido.
A máfia da água
Sem água, os moradores da cidade passaram a furar poços em ritmo insustentável. Foi a partir de um levantamento que mostrou o ritmo de exploração da água armazenada em lençóis freáticos da região que se fez a previsão de que a cidade seria inabitável pela falta do recurso a partir de 2020. Antigamente, quem furava um poço em Bangalore encontrava água a, no máximo, 60 metros de profundidade. Hoje, a menos de 300 metros, ninguém mais acha um fio de água sequer.
Para dar conta da demanda dos ricos moradores, uma rede de mais de três mil caminhões pipa se organizou para distribuir dezenas de milhões de litros de água. Não tardou para que a cartelização, o loteamento de bairros e até o lobby contra medidas de gestão hídrica mais eficientes surgissem para proteger o lucrativo mercado que surgiu.
Existe uma saída
Em entrevista à revista Wired, o urbanista S. Vishwanath, descrito como “o principal evangelista pelo consumo sustentável de água” da cidade arrolou as medidas que, segundo ele, não apenas mitigariam, como resolveriam o problema. Se os prédios comerciais e residenciais instalassem sistemas de coleta de água de chuva, se a cidade recorresse ao reúso de suas águas, se ritmo de construção de empreendimentos infraestruturais e comerciais que impermeabilizam o solo diminuísse e se os lagos da cidade fossem reativados – o problemas desapareceriam por completo. Os lençóis freáticos seriam recarregados e todos teriam água sem precisar recorrer à chamada “máfia da água”.
Até 2020, saberemos se Bangalore correu atrás do prejuízo e se conseguiu reverter a sua situação. Às outras capitais mundiais fica o alerta: não tratar a água com a atenção que ela merece pode ter consequências gravíssimas, mesmo em cidades ricas e com populações esclarecidas.