SÃO PAULO – De nome complicado e pouco conhecido pelo brasileiro, o mosquito Aedes aegypti entrou, nos últimos dois anos, para o vocabulário nacional e tem dominado as atenções tanto dentro quanto fora do País. Pudera, só em 2015, mais de 1,6 milhão de pessoas ficaram doentes graças a uma picada do Aedes, que transmite os vírus da dengue, Zika, chikungunya e febre amarela (erradicada na sua forma urbana desde 1942). Em 2016, as coisas pouco mudaram. De acordo com o último boletim epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde, até 9 de julho foram registrados 1,4 milhão de casos de dengue, 174 mil casos prováveis de febre pelo virus Zika e outros 170 mil casos prováveis de chikungunya.
Com doentes registrados nas grandes cidades de norte a sul do País durante todo o ano, fica claro que o pequeno Aedes aegypti é uma verdadeira potência, igualmente resistente e flexível na hora de atacar a população. Segundo estudiosos, o mosquito está no Brasil desde os tempos coloniais e, provavelmente, chegou aqui pelas mãos dos mercadores de escravos. Em 1955, sanitaristas chegaram a declará-lo erradicado por aqui. Mas, em 1967, o mosquito acabou reintroduzido no País, provavelmente pela fronteira que separa o Estado do Pará da Guiana – ou ainda pelo porto de Belém, capital daquele Estado.
Desde então, o Aedes aegypti se adaptou bem às especificidades do País, sem nunca deixar de preocupar os sanitaristas. Recentemente, por exemplo, uma pesquisa conduzida pelo Instituto Butantan, em São Paulo, mostrou como o mosquito se molda com rapidez ao seu habitat. Hoje, parte cada vez maior dos Aedes aegypti urbanos consegue se reproduzir em volumes de água menores que os exigidos por seus predecessores, apresenta resistência aos inseticidas mais populares e pica em horários antes tidos como livres de Aedes, como durante a noite.
Saneamento e o combate ao Aedes aegypti
Há, porém, maneiras de combatê-lo. E uma que tem ficado em segundo plano, apesar de ser de suma importância, é a expansão dos serviços de saneamento básico. “Há um forte vínculo entre sistemas de saneamento deficientes e o surto atual do Zika vírus, bem como da dengue, da febre amarela e do chikungunya”, diz Léo Heller, relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o direito humano à água e ao saneamento. “E a maneira mais efetiva de enfrentar esse problema é melhorar esses serviços [de saneamento básico]”, diz Heller. A afirmação foi feita em comunicado sobre o tema divulgado em março de 2016.
É fácil entender a relação entre falta de saneamento básico e expansão dos vírus que têm, como vetores, mosquitos como o Aedes aegypti. Uma casa com abastecimento de água intermitente, por exemplo, força seus moradores a estocar o recurso nos poucos momentos em que ele está disponível. Como nem todos tampam suas caixas d’água, potes, barris e outros recipientes de forma correta, a água estocada vira criadouro de mosquitos – entre eles, o Aedes aegypti. A ausência de sistemas de coleta de esgoto tem efeito parecido. Diferente da crença popular, o mosquito não precisa de água potável para se reproduzir – basta que o líquido não tenha quantidade importante de material em decomposição. Desta forma, uma poça de esgoto a céu aberto, eventualmente diluída pela chuva, pode funcionar, perfeitamente, como um criadouro do Aedes.
Em cidades onde não há recolhimento sistemático de lixo – serviço que compõe, com água, esgoto e manejo de águas pluviais, o atual entendimento de saneamento básico pleno -, a situação se agrava. Com garrafas, embalagens plásticas e pneus acumulados, ao ar livre, em quintais, becos e ruas, basta que chova para que água se acumule e que surjam novos criadouros do mosquito. E se não chover, não tem problema já que os ovos do Aedes aegypti continuam viáveis por até 500 dias, mesmo sem uma gota de água sequer.
Os bons exemplos
Em sintonia com o entendimento da ONU sobre a importância do saneamento básico no combate ao Aedes aegypti, concessionárias que prestam serviços água e esgoto mergulharam na guerra ao mosquito e às doenças que ele transmite. E o esforço não se limitou às medidas operacionais, como a expansão do atendimento aos clientes e a redução das intermitências no fornecimento de água. Algumas empresas assumiram grandes campanhas de esclarecimento e conscientização da população sobre os riscos de alguns comportamentos e as melhores práticas para evitar surtos.
A Odebrecht Ambiental, por exemplo – com seus mais de 17 milhões de clientes espalhados por 186 cidades brasileiras – fez campanha intensa em todas as praças onde atua. Em várias, funcionários passaram a usar uniformes alusivos à campanha de combate ao Aedes, houve trabalho em conjunto com órgãos do governo municipal e contato intenso com veículos de imprensa locais para afinar o discurso de enfrentamento. “Sempre entendemos nosso papel de disseminadores de informação nos municípios em que atuamos. Temos uma rede grande de agentes que visitam mensalmente as casas dos nossos clientes e com isso a possibilidade de levar mensagens importantes para a população”, diz Fernando Santos-Reis, diretor presidente da Odebrecht Ambiental.
Outra frente de atuação da empresa é a internet – principalmente, as redes sociais. Com a campanha “100 Dias Sem Aedes” – hashtag #100DiasSemAedes -, por exemplo, a concessionária fez 100 postagens durante 100 dias em sua página oficial no Facebook. Publicações como a “Missão do Dia” – que convidou os leitores a limparem as calhas ou a verificarem a vedação dos ralos -, e conteúdos que esclareciam quais eram os diferentes tipos de dengue tiveram grande alcance e repercussão. “Todos os anos nos empenhamos em dar visibilidade as campanhas nacionais sobre a dengue, e em 2016 entendemos que poderíamos reforçar a comunicação sobre prevenção utilizando a nossa rede já que o aedes passou a transmitir outras doenças até então desconhecidas pelos brasileiros. O engajamento foi bem positivo”, complementa.
Ainda dentro do esforço virtual, criou-se a campanha “Aedes Nunca Mais” – com a hashtag #AedesNuncaMais – igualmente divulgada nas redes sociais da empresa. Com uma bem humorada música tema e clipe oficial, ela estimulou a atenção da população às boas práticas de combate ao Aedes, como o monitoramento de possíveis focos do mosquito dentro de casa e no bairro (veja o clipe abaixo). Afinal, não adianta eliminar os focos de uma única casa se a vizinhança continua repleta de criadouros.
Somadas, as campanhas “100 dias Sem Aedes” e “Aedes Nunca Mais” chegaram a quase 3 milhões de usuários apenas no Facebook – e só o clipe teve mais de 41 mil execuções no YouTube. Isso mostra, primeiro, que há grande interesse do público pelo assunto e, segundo, que há espaço para o saneamento básico na discussão e nas ações de combate ao mosquito vetor dos vírus da dengue, Zika, chikungunya.
Boa parte dos especialistas em Aedes aegypti diz ser impossível erradicá-lo do Brasil. Mas muito pode ser feito para reduzir os estragos que esse pequeno gigante tem feito por aqui. E investir em saneamento básico é um dos caminhos mais garantidos nesse sentido.